Instituído em 1992 com o objetivo de sensibilizar a comunidade global e ganhar colaboração de governos, organizações e indivíduos a desenvolverem iniciativas, o Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado ontem, serviu mais uma vez para chamar a população brasileira ao cuidado: levantamento da Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que o Brasil é o país com o maior número de pessoas ansiosas: 9,3% da população.
E a data de ontem também fez um grande alerta sobre a saúde mental dos brasileiros: sem avaliação, sem políticas públicas eficazes e sem combate ao estigma da psiquiatria, é possível que uma em cada quatro pessoas no país sofrerá com algum transtorno mental ao longo da vida.
Outro levantamento, feito pela Vittude, (plataforma online voltada para a saúde mental e trabalho), aponta que 37% das pessoas estão com estresse extremamente severo, enquanto 59% se encontram em estado máximo de depressão e a ansiedade atinge níveis mais altos, chegando a 63%.
Diante dessa realidade, que vem se intensificando, especialistas acreditam ser mais do que urgente reduzir o estigma em torno do acesso à psiquiatria, além de aumentar e capacitar os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) nos municípios. Dessa forma, o desenvolvimento de doenças mentais pode ser evitado com antecedência, promovendo qualidade de vida e reduzindo também diversos gastos da saúde pública e desgastes familiares.
Para a psiquiatra e coordenadora do Centro de Estudos da Holiste Psiquiatria, Fabiana Nery, a realidade ansiosa do brasileiro está enraizada em diversas questões, inclusive nas diferenças sociais, mas cada caso tem uma particularidade.
“O brasil está num nível alto de sintomas ansiosos. 40% da população no brasil relatando um quadro de sintoma ansioso. A gente tem uma cultura de achar que é um povo tranquilo, brincalhão, mas não é bem assim”, diz.
Segundo ela, é preciso que a sociedade, de maneira geral, se atente as próprias características e busque a ajuda de um especialista. “Quando perceber a mudança deum padrão de comportamento que já existia, e essa maneira nova está sendo mantida por um tempo e está causando prejuízos em várias esferas na vida do indivíduo. É um sinal de alerta para investigar aquela mudança”, explica.
A psiquiatra explica que ter um sintoma ansioso não significa ter um transtorno de ansiedade generalizada (TAG), assim como estar constantemente triste não significa se tratar de uma depressão. Ela ressalta, entretanto, que é importante estar atento aos sintomas, pois eles podem se agravar e chegar a uma doença.
“O próprio paciente não consegue perceber que está ficando doente. A doença psiquiátrica é insidiosa, começa quando adolescente. O adolescente diz que é nervoso, que é estressado e às vezes vai modulando comportamento desde a adolescência”, diz.
Sobre os quadros de esquizofrenia, alcoolemia, depressão, transtorno de bipolaridade, Nery reforça que as motivações podem ser casuais, genéticas ou características de personalidade moldadas também pelo ambiente onde esse indivíduo está envolvido. “O bipolar tem uma questão genética muito forte. Mas não é uma sentença, as vezes a pessoa pode ter uma genética para o transtorno e ter uma vida adequada, e pode nunca desenvolver a doença apesar de ter histórico. E o contrário também pode acontecer, da pessoa ao longo da vida ter sintomas, não se avaliar, e aliado ao uso de substâncias psicoativas, desenvolver o transtorno. Que é uma doença crônica”, declarou.
Hiperconectividade pode despertar ansiedade e depressão
Psicoterapeuta Transpessoal Sistêmica, Eletice Rangel destaca que depois da pandemia a saúde mental do brasileiro se agravou, mas, aliado a isso, a hiperconectividade também foi um fator que colaborou com o aumento dos sintomas de ansiedade.
“As pessoas, hiperconectadas, podem ficar mais ansiosas e podem desenvolver quadro de depressão. Existe um descompasso entre a vida interna do ser e o mundo externo”, pontua, ressaltando que as redes sociais também são gatilhos para despertar diversos sintomas que podem levar, ou agravar, inclusive, quadros de depressão.
“As redes sociais são geradores de diversos sintomas em diversos aspectos. Podem mexer com a auto estima das pessoas. A questão da intensidade do tempo que dispensamos. Lá, as pessoas só mostram o lado bonito da vida delas. Pra a grande maioria da população, que está enfrentando as dificuldades do dia a dia, aquela felicidade parece distante de sua realidade e quem não está bem, acaba se sentindo pior. Porque não conseguem atingir os modelos de corpo, os padrões de sucesso que estão consumindo ali”, explicam.
Segundo ela, a dinâmica da vida corrida, as transformações econômicas, sociais e tecnológicas levaram a sociedade a viver numa urgência muito grande. “O fato de a gente estar sempre no futuro faz com que a gente perca a sensação do presente, do estar aqui e agora. E isso faz com que a gente só olhe pra fora e não para dentro. Acabamos ficando numa distância muito grande entre nossa essência e o que estamos buscando. Isso gera uma ansiedade muito grande que pode chegar a uma TAG ou até quadros depressivos”, acrescenta.
Para além do que o Estado pode promover em termos de política pública e assistência, Eletice Rangel disse que é preciso fortalecer o debate em torno da saúde mental para acabar com os preconceitos. “A saúde mental é difícil de ser tratada porque as pessoas não gostam de admitir e tem dificuldade. Precisamos criar uma rede de apoio na sociedade par que olhemos para nós e para o próximo. Trazer alerta para que as pessoas possam olhar para si. Existe um descompasso entre a vida interna do ser e o mundo externo”, diz. A psicoterapeuta recomenda que as pessoas busquem o auto cuidado; e criem uma rede de apoio para dar suporte a quem tiver sintomas. “Estar atentos aos sinais”, finaliza.
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