Feira de Santana — Foto: Divulgação
A Prefeitura de Feira de Santana admitiu, através do seu site oficial, que os dados foram publicados erroneamente na Portaria nº 19/2025 da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana, na edição do último sábado (20) do Diário Oficial Eletrônico do Município, que trata da suspensão do benefício do passe livre no transporte coletivo urbano, conforme decisão judicial. O Boca de Forno News fez uma reportagem sobre esse assunto que é grave, falando sobre as repercussões judiciais e psicológicas para essas pessoas.
Mariana Rodrigues - Foto: Arquivo Pessoal
A presidente da Comissão de Direitos Humanos da Subseção Feira de Santana, Mariana Rodrigues, falou sobre o vazamento de dados dos portadores de fibromialgia, HIV e anemia falciforme. A advogada chamou o erro de grotesco e absurdo que aconteceu no município. Questionada quais as repercussões que um caso como esse pode ter para a cidade de Feira de Santana, ela disse que primeiro teria que analisar o prejuízo de forma individual.
“Temos que obervar a cada pessoa que sofreu esse prejuízo, mas não é precipitado afirmar que há um dano, principalmente para pessoas que possuem HIV/AIDS que teve o seu sigilo sorológico quebrado. É uma questão complicada que pode ensejar diversos preconceitos contra essas pessoas que estão tentando seguir suas vidas da forma mais saudável possível”.
Analisando a situação na esfera criminal, vê-se claramente a configuração do crime de violação do segredo profissional, ressalta. “É um crime previsto no artigo 154 do Código Penal que fala justamente da possibilidade da conduta de revelar, sem justa causa, um segredo que a pessoa tem em razão de uma função. Ou seja, o segredo que a Secretaria de Mobilidade Urbana obtinha em razão da sua função de secretário do Município”.
Nesse tipo de crime, a ação só é processada mediante representação. “As vítimas da conduta que se sentiram violadas podem procurar a Delegacia ou o Ministério Público para demonstrar o interesse de representar criminalmente contra a conduta que desferiu um dano inimaginável”.
Em relação a possibilidade de ajuizar uma ação na esfera cívil, para a obtenção de uma indenização, a advogada disse que é possível. “Até porque estamos falando de dados sensíveis, de violação de direitos humanos, de violação da Lei Geral de Proteção de Dado (LGPD) que precisam ter uma resposta mais eficaz e uma preocupação maior do município em relação a eles”.
A comissão da qual presidente afirmou ainda emitirá ainda uma nota de repúdio em conjunto com a Comissão de Diversidade Sexual da OAB Subseção Feira de Santana. Até a publicação dessa matéria a nota ainda não havia sido publicada.
GRUD
O GRUD – Grupo de Resistência e União pela Diversidade também se manifestou. Veja a nota de repúdio:
"O GRUD – Grupo de Resistência e União pela Diversidade vem a público manifestar seu mais profundo REPÚDIO ao ato criminoso cometido pela Prefeitura Municipal de Feira de Santana, por meio da Secretaria de Saúde, ao divulgar no Diário Oficial uma lista contendo os nomes de mais de 600 pessoas vivendo com HIV.
Tal prática viola frontalmente a Constituição Federal, a Lei nº 12.984/2014, que tipifica como crime a discriminação contra pessoas vivendo com HIV/AIDS, bem como diversos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. O ato fere a dignidade, a privacidade e o direito à proteção de dados dessas pessoas, expondo-as a constrangimentos, estigmas e discriminação.
Ainda que a Prefeitura tenha alegado tratar-se de um “engano” relacionado à negativa de pedidos de transporte público, não há justificativa possível para a exposição de informações sigilosas e sensíveis dessa natureza. O ocorrido não se trata de mero erro administrativo, mas sim de um crime contra a população vivendo com HIV/AIDS.
O GRUD exige:
A imediata responsabilização dos(as) gestores(as) envolvidos(as) nessa grave violação;
A retratação pública da Prefeitura Municipal de Feira de Santana;
A garantia de medidas reparatórias às pessoas afetadas;
A implementação urgente de protocolos de segurança e confidencialidade nos serviços públicos de saúde e assistência social.
Não aceitaremos retrocessos nem violações aos direitos humanos! Nossa luta é pela vida, pelo respeito e pela dignidade das pessoas vivendo com HIV/AIDS e de toda a comunidade LGBTQIAPN+.”.
Portaria que cria comissão é publicada
Foi criada Comissão de Sindicância com a finalidade de apurar o vazamento de dados que resultou na divulgação indevida de informações pessoais de cidadãos portadores de Fibromialgia, HIV e Anemia Falciforme. A portaria de nº 965/2025 foi publicada no Diário Oficial do Município, edição nº 3343, publicada em 20 de setembro de 2025.
A medida foi determinada pelo prefeito José Ronaldo de Carvalho, que designou três servidores para compor a comissão: Luiz Carlos de Carvalho Bahia Neto; Rodrigo Santos Matos; e Juliana Nascimento da Silva.
De acordo com a portaria, a presidência da comissão será exercida por Luiz Carlos Neto Bahia. O grupo terá o prazo de 15 dias, a contar da data da publicação, para encaminhar ao Gabinete do Prefeito um relatório conclusivo sobre o caso.
A Prefeitura reforça seu compromisso com a proteção dos dados pessoais e o respeito à privacidade dos cidadãos, e assegura que todas as providências necessárias estão sendo adotadas para esclarecer os fatos e evitar que situações semelhantes se repitam.
Repercussões na vida das pessoas com HIV/AIDS
O preconceito contra as pessoas com HIV/AIDS causa estigma, exclusão social, assédio moral e físico, além de afetar a saúde mental dessas pessoas e dificultar o acesso a tratamentos e ao emprego. Vale ressaltar que no Brasil, a Lei 12.984/2014 tornou a discriminação por sorologia um crime, punível com reclusão e multa.
Flaviane Dias - Foto: Arquivo Pessoal
A psicóloga Flaviane Dias falou sobre as repercussões psicológicas que uma exposição como essa pode causar em uma pessoa que possui HIV/AIDS. De acordo com a profissional, essa quebra de sigilo é uma violação grave dos direitos humanos da saúde, além de ser uma questão ética e ilegal. “Essa exposição pode trazer diversas repercussões psicológicas para quem foi afetado. Elas podem ter sequelas profundas. Além de colocar em risco sua privacidade, gera esse sofrimento psicológico intenso, marcado por sentimentos de vergonha, humilhação, ansiedade, medo da discriminação e, em muitos casos, isolamento e até mesmo o abandono do tratamento”, ressalta.
Ainda de acordo com Flaviane, quando algo do tipo se torna público sem autorização, a pessoa pode enfrentar esse sentimento de julgamento. “O que leva ao isolamento social, a perda de vínculos afetivos e até dificuldades de manter seu trabalho ou estudo. Do ponto de vista emocional, a exposição pode gerar pensamentos de desesperança ou ideação suicida. Precisamos estar atentos a esses pontos”.
Flaviane diz ainda que é importante lembrar que os avanços dos tratamentos permitem uma vida longa e saudável para quem possui o HIV. “Porém ainda existe um preconceito, que é um grande desafio para quem tem o vírus do HIV. Enquanto sociedade, nós precisamos desenvolver empatia, responsabilidade, acolher, apoiar e respeitar a privacidade dessas pessoas e assim garantir a sua dignidade”.
Outro ponto importante, salienta a psicóloga, é que a saúde mental dessas pessoas depende não apenas do tratamento médico, mas do ambiente onde vive. “Proteger o sigilo é proteger a vida. Mais do que nunca é hora de reforçar que o HIV não define ninguém e que todos merecem viver com respeito, cuidado e humanidade”, finaliza.
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