A sucessão de Rui Costa por Jerônimo Rodrigues no governo da Bahia marcou uma continuidade política, mas com nuances que apontam para uma nova fase da gestão petista no estado. Essa é a análise do cientista político Cláudio André, em entrevista ao site. Segundo o professor da Unilab (Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira) e pesquisador da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia), Jerônimo amplia a presença do governo no interior e fortalece a relação com o Palácio do Planalto, o que representa uma mudança estratégica em relação ao antecessor.
O pesquisador também destaca que a oposição liderada por ACM Neto precisará reinventar sua atuação para 2026, diante do avanço do governador. O lulismo, por sua vez, segue forte no estado, mas dependerá do desempenho nacional do governo Lula. Cláudio ainda aponta a segurança pública como tema central no próximo pleito e avalia que a polarização deve continuar dominando o cenário eleitoral.
O que mudou no perfil de governança na Bahia com a transição de Rui Costa para Jerônimo
"Essa perspectiva de governança, envolvendo uma transição e sucessão entre Rui Costa e Jerônimo, obviamente que eu vejo que é marcada por um cenário de muita continuidade, por um padrão de continuidade de governo, de lideranças e na forma, sobretudo, de lidar diretamente com um fato que envolve a própria geografia eleitoral da Bahia, que é esse cuidado com os municípios. Então, de alguma maneira, me parece que há uma estratégia central – duas estratégias centrais, melhor dizendo – que, no caso, o governador Rui Costa não conseguiu ter, que foi uma parceria federal. E a outra questão, que é muito importante a gente também levar em consideração, é exatamente a premissa de que agora parece que Jerônimo entende, cada vez mais, a necessidade de aprofundar aquilo que Rui já vinha fazendo, que era a visita aos municípios, o contato direto com a população, com as lideranças políticas locais. E isso, inclusive, decorre da persona, da imagem, do próprio perfil de liderança do governador Jerônimo Rodrigues, que envolve diretamente uma figura do interior, um governador do interior. Talvez, ainda nessa primeira pergunta, o que falte a Jerônimo talvez seja um cuidado mais efetivo no âmbito da comunicação do governo quanto à gestão".
ACM Neto está em reestruturação política após derrotas sucessivas
"Eu vejo que o ex-prefeito ACM Neto é a grande liderança natural da oposição ao PT na Bahia. Essa foi uma construção que, inclusive, nesses últimos anos, não se deu em torno de uma alternativa construída. Nenhum outro nome – ou alguns nomes – foram ventilados ou colocados como alternativa a ACM Neto na disputa estadual. Ele age de uma forma muito inteligente, do ponto de vista de como ele começa a estabelecer, inclusive, uma oposição radical a Jerônimo, e ele não faz o mesmo a Lula – embora ele teça críticas, mas sempre de uma forma muito calculada –, exatamente para dosar o que a gente poderia ver como um antipetismo mais radical, que vem, que é oriundo do PL, ou seja, vem do setor mais alinhado ao bolsonarismo. E ele foi levado a ter que mudar, inclusive, de estratégia, porque esse avanço do Jerônimo como liderança e como governador do interior levou diretamente ele a sair do gabinete, literalmente. Então, essa agenda que ACM Neto fez agora no São João, dentro da perspectiva de apresentar uma imagem como sendo essa liderança que está na rua, é exatamente já o resultado da disputa, do quanto o governador Jerônimo avança, desde o início do ano, no diálogo com prefeitos que estavam na oposição, que agora começam a acenar para a possibilidade real de marchar com Jerônimo em 2026. Então, esse é um cenário que eu acho que está dado, de uma liderança que vai ter que olhar para esse cenário de ser candidato a governador. Do ponto de vista do cálculo político, esse lugar na chapa, na eventual chapa de Tarcísio para presidente – enfim, um lugar nacional hoje –, ele não é o mais concreto, porque esse lugar na chapa nacional precisa ser dado para outras lideranças políticas mais testadas e com mais voto, e com uma possibilidade real de ter essa virada ali na perspectiva nacional."
Força do Lulismo
"Essa é uma questão que a gente sempre deve levar em consideração a partir de pesquisas, de dados empíricos. Mas, a priori, a força do lulismo na Bahia continua sendo um fato. O presidente Lula ainda tem muito apoio político na Bahia. No entanto, a gente deve olhar com atenção o que é que vai acontecer no âmbito da popularidade do governo federal nos próximos meses. Ou seja, se esse viés de queda, de abalo na popularidade no âmbito nacional, ela se refletirá na Bahia. Mas, com certeza, o presidente Lula tem uma liderança consolidada, e esse é o grande trunfo do PT nas últimas eleições."
Possível exclusão do PSD da chapa majoritária
"Essa questão do PSD na Bahia é algo que não será feito à revelia de uma estratégia nacional do presidente Lula. Então, o que vai acontecer em 2026, na verdade, é que essa estratégia da chapa na Bahia, em um dos colégios eleitorais mais importantes do Brasil, é exatamente algo que a gente vai observar dentro da perspectiva do que o presidente Lula vai estabelecer, do que o Palácio do Planalto vai olhar e entender como estratégia eleitoral para 2026. O que eu quero dizer, em tese, é que essa possível exclusão do PSD da chapa de 2026 – e aí tem uma diferença: a exclusão virá do Senado, de uma candidatura ao Senado, desse lugar como vice-governador da chapa, no lugar da condição de vice – é isso que não está dado. Mas a grande questão é que isso vai ser contemplado, talvez, em nível nacional. E é isso que está, hoje, colocado como um balão de ensaio. Muitas coisas podem acontecer daqui até lá, e essa chapa pode ter alguma reviravolta, por exemplo. Então, eu não sei como é que a gente vai avaliar, nesse momento, essas questões, diante de muitos acontecimentos que podem, de fato, vir à tona. Mas eu vejo que, no âmbito do lugar que o PSD hoje estabelece na relação com o presidente Lula, e essa relação do senador atual com o presidente, eu vejo que tudo vai caminhar para um diálogo. E talvez a costura da chapa estadual vá levar em consideração a montagem do governo e das estratégias em nível nacional."
Vitória contínua do PT na Bahia sinaliza um ciclo de hegemonia regional
"De fato, a gente está diante de uma hegemonia do PT, mas ela é feita diante de um equilíbrio político gigantesco, coisa que não acontecia durante o carlismo. Se você for olhar, por exemplo, o grupo carlista, ele sempre colocava um vice-governador do próprio PFL. Durante anos, as chapas do PFL eram chapas de puro sangue. Então, isso daí acontecia diante de um centralismo político gigantesco, e o modelo do PT é exatamente o oposto. Ele vence as eleições de 2006 a 2022 na Bahia diante de um equilíbrio de forças políticas enorme. E isso, inclusive, vai se refletir na relação com a presidência da Assembleia Legislativa, na indicação dos senadores, na perspectiva também da bancada estadual e na Câmara dos Deputados. Então, você consegue ver ali um equilíbrio político acentuado. E essa fórmula de equilíbrio político é o que marca, inclusive, a própria visão que o PT estabeleceu no âmbito nacional. Os governos de coalizão em nível nacional levaram a esse cenário."
Fadiga material
"Sobre essa fadiga de material, pode acontecer, né? Pode acontecer não só no âmbito das lideranças, mas do grupo governista como um todo – as lideranças que estão nas secretarias, no âmbito burocrático, planejando as políticas públicas. Agora, quando a oposição fala em uma fadiga de material, na verdade, ela está falando o seguinte: você tem, por parte dos eleitores, a cobrança de novas lideranças para resolver determinadas agendas. A gente deve entender que o governador Jerônimo é uma nova liderança. Isso daí é que, às vezes, eu acho que é um contrassenso na análise. O PT e o grupo governista acenam para um candidato que foi testado nas urnas, que é uma novidade, um nome novo, mais alinhado a ser um governador muito mais com a cara do interior do que da capital, das grandes cidades. Então, essa é uma grande novidade que a gente vai perceber, inclusive mais: um governador ligado à educação, professor, sabe? Então, assim, eu vejo que é isso que a gente vai observar. Mas a fadiga talvez seja em que sentido? Porque também essa figura de ACM Neto como uma novidade, como uma grande novidade, ela não existe mais. Já é um político experiente, já com vários mandatos de deputado federal, prefeito duas vezes. Então, é algo também que a gente deve observar, que às vezes pode estar muito mais dado num campo da retórica – muito mais uma questão retórica de apresentar uma visão de cenário do que realmente algo baseado em dados e evidências."
Principais temas e fatores que deverão influenciar o pleito presidencial de 2026
"A grande questão que talvez se colocará na agenda em nível nacional e também nível estadual deve ser, sem sombra de dúvida, na minha visão, a questão da segurança pública. É cada vez mais acrescente na preocupação de pessoas do interior, das capitais, das grandes cidades, grandes centros urbanos, pequenas cidades. A gente começa a ver que a pauta da segurança pública se torna central. A violência de gênero também é algo que as políticas ainda precisam ser avançadas porque ela existe, ela está colocada hoje."
Espaço para novos atores políticos independentes ou surgimento de terceira via na eleição presidencial
"Muito difícil. Esses atores políticos, a terceira via, eu acho que sempre há espaço para surgir. Não sei se vai ter espaço para ganhar as eleições, para que a terceira via ganhe as eleições. Mas é algo que sempre pode surgir, uma agenda específica de uma candidatura que tenha 5, 10, 15%. Eu acho que nesse momento, o que está se colocando, inclusive, é que possíveis terceiras vias devem dialogar com uma unificação. Então, veja, por exemplo, que há uma tendência de unificação do bolsonarismo com Tarsísio, com Caiado, com alguns nomes que estão postos em nível na disputa presidencial. Mas, nesse momento, me parece que nós estamos caminhando para uma nova polarização entre dois grupos que demarcam aí uma força política enorme, como a gente viu em 2022, onde nós tivemos a maior polarização desde a redemocratização, com uma diferença mínima de votos entre um grupo e outro."
Apoio de Bolsonaro
"É uma questão que está em aberto, eu não vejo condições de força política para Bolsonaro nesse momento impor uma candidatura que seja suficientemente forte para vencer as eleições, sabe? Eu acho muito difícil diante do que a família viveu à frente do poder, à frente da pandemia. Me parece que o mercado, que alguns partidos políticos, algumas forças podem assinar para a União, para um candidato. É como se estivesse buscando um candidato mais moderado dentro do bolsonarismo para vencer as eleições. Uma espécie de tática pragmática para vencer as eleições. Eu acho muito difícil que a gente perceba um cenário no qual a gente veja uma perspectiva mesmo de construção de uma candidatura à la carte, de uma candidatura solo do bolsonarismo. Mas isso não pode ser descartado agora. Mas acho que a tendência maior é pela unificação para que haja uma união mais forte. A outra questão que está em debate que a gente não pode deixar de considerar é saber o seguinte: um candidato mais moderado com o apoio da família Bolsonaro ganha ou perde voto? Então é essa também uma questão que está posta."
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