A violência sexual contra crianças e adolescentes é uma realidade alarmante no Brasil e, na Bahia, os números são especialmente preocupantes. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024 revelam que, em 2023, 75% das vítimas de estupro no país tinham até 17 anos. No Brasil, a cada hora, sete crianças ou adolescentes são violentadas sexualmente. Na Bahia, o cenário é igualmente trágico: foram 5.302 vítimas de estupro ao longo do último ano, uma média de 14 casos por dia. Dessas, 71% eram pessoas consideradas vulneráveis, ou seja, com até 14 anos.
Nos últimos meses, diversos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes ganharam grande repercussão, evidenciando a gravidade desses crimes. Um dos casos mais chocantes foi o de Aysha Vitória, que desapareceu por volta das 17h de uma segunda-feira, 22 de julho de 2024. A família registrou imediatamente a queixa do desaparecimento, mas, infelizmente, por volta das 4h40 da madrugada do dia seguinte, o corpo da menina foi encontrado a apenas 10 metros de sua casa. Aysha foi estrangulada e estuprada por um vizinho da família, e sua morte gerou comoção e indignação na comunidade.
Outro caso alarmante ocorreu no bairro da Capelinha, em Salvador, onde um homem foi preso sob a suspeita de abusar sexualmente de suas 13 sobrinhas ao longo de 25 anos. O crime foi denunciado no primeiro semestre de 2023, após as vítimas, agora adultas, perceberem um padrão nas ações do acusado durante suas infâncias e adolescências. O caso chamou a atenção para a importância de romper o silêncio em situações de abuso familiar.
Na cidade de Jacobina, um homem foi preso na quarta-feira, 18 de outubro de 2024, por suspeita de estuprar seu enteado de 11 anos. A criança, que possui transtornos do espectro autista, se tornou vítima de um crime horrendo, revelando a vulnerabilidade adicional que algumas crianças enfrentam. As informações preliminares indicam que a condição do menino o tornava ainda mais suscetível a esse tipo de violência.
Diante dessa triste realidade, é fundamental discutir as ferramentas que o Brasil possui para garantir os direitos dessas vítimas. A criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, foi um marco na proteção integral à criança e ao adolescente, garantindo seus direitos à saúde, educação, dignidade e segurança. Mais recentemente, a Lei nº 13.431, de 2017, estabeleceu o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência. Este sistema trouxe procedimentos importantes, como a Escuta Especializada e o Depoimento Especial, formas de ouvir crianças e adolescentes em situações de violência sem revitimizá-los.
A lei determina que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios implementem políticas integradas para garantir os direitos humanos de crianças e adolescentes, protegendo-os de negligência, discriminação, exploração, violência, abuso, crueldade e opressão nas relações domésticas, familiares e sociais.
Campanhas de conscientização devem ser realizadas periodicamente para facilitar a identificação da violência contra crianças e adolescentes, além de promover seus direitos e os serviços de proteção disponíveis. A legislação também classifica diferentes formas de violência, incluindo física, psicológica, sexual e institucional, esta última cometida por instituições públicas ou conveniadas, especialmente quando resulta em revitimização.
Essa estrutura legal visa assegurar que, além de receberem atendimento humanizado, as vítimas de abuso sexual tenham seus direitos plenamente garantidos, minimizando os traumas e promovendo justiça de forma eficaz.
É o que explica o advogado Vinícius Dantas, presidente da Comissão de Direito Prisional e Segurança Pública da OAB-BA. Ele lembra que a existência do sistema que garante esses direitos é de suma importância, já que tem o papel de definir os procedimentos para que a vítima possa ser acolhida por profissionais especializados.
"A Lei que institui o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência define procedimentos para a escuta e o depoimento especializado de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, garantindo que sejam ouvidos de forma segura e sem revitimização. No caso da escuta especializada, realizada por profissionais da rede de proteção, com o objetivo de entender a situação de violência sem traumatizar ainda mais a vítima. Já o depoimento especial, faz a coleta de prova em processo judicial, feita em ambiente protegido e acolhedor, com mediação de profissionais capacitados, assegurando que os depoimentos sejam colhidos sem expor as vítimas a novas situações traumáticas", explicou.
O advogado explica também que, para além da proteção às vítimas que já sofreram com esses abusos, o sistema é uma ferramenta de prevenção, podendo articular um trabalho conjunto de órgãos para que novos crimes do tipo possam ser evitados.
"Garante que crianças e adolescentes sejam ouvidos de forma humanizada, com atendimento especializado e sem exposição a situações que possam agravar o trauma. Mas a articulação entre órgãos de saúde, educação, justiça e assistência social permite uma resposta rápida e eficaz a casos de violência, facilitando a identificação e prevenção de novos abusos'', disse.
E expõe que existem outras leis no nosso Código Penal com o mesmo objetivo: proteger crianças e adolescentes.
"Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): Define a proteção integral da criança e do adolescente, prevendo o dever de denúncia e a oferta de acompanhamento especializado para vítimas de abuso. A Lei Maria da Penha: Aplica-se também às crianças e adolescentes expostos à violência doméstica, garantindo medidas protetivas e Lei da Alienação Parental, que protege as crianças de manipulações psicológicas realizadas por familiares, prevendo acompanhamento psicológico e jurídico".
Porém, Vinícius Dantas também aponta falhas em todo o sistema de acolhimento, proteção, prevenção e de garantia dos direitos da criança, vítimas ou não desses crimes. O mestre em Direito explica que, embora o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência traga um panorama novo em alguns aspectos, é necessário fortalecer pontos-chave no tema.
"Embora a Lei nº 13.431/2017, que instuiu o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência. represente um avanço, alguns aspectos ainda precisam ser aprimorados para maior efetividade, a exemplo:
Melhor estrutura e capacitação: Há falta de profissionais treinados e de equipamentos adequados em muitas regiões do país. A expansão e a capacitação das redes de atendimento são necessárias.
Integração entre serviços: Apesar da previsão de protocolos de atendimento, a integração entre os setores de saúde, educação, assistência social e justiça ainda é falha. É essencial fortalecer essa articulação para um atendimento mais eficiente.
Acompanhamento contínuo: O suporte à vítima não deve se limitar ao depoimento; é preciso um acompanhamento contínuo para garantir a segurança e o bem-estar da vítima
Prevenção e conscientização: Campanhas educativas para a sociedade e programas nas escolas são fundamentais para prevenir novos casos de violência e aumentar a conscientização sobre os direitos das crianças e adolescentes.
Acredito que com esses avanços, pode-se alcançar maior eficácia na proteção e prevenção de casos de violência conta a Criança e ao Adolescente, para com isso, lhes proporcionar um futuro digno e prospero", finalizou.
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