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Flay Conceição, o Palhaço Charmosinho, reclama da falta de apoio a cultura circense em Feira de Santana

Segundo Flay, o circo não foi contemplado na Lei Paulo Gustavo. Dos dez que inscreveram seus projetos, nenhum conseguiu ser aprovado. 

06/07/2024 23h42
Por: Karoliny Dias Fonte: Boca de Forno News
Palhaço Charnosinho e os filhos - Foto: Boca de Forno News
Palhaço Charnosinho e os filhos - Foto: Boca de Forno News

O artista circense Flay Oliveira da Conceição, mais conhecido como o Palhaço Charmosinho, dono do Circo Charmosinho, falou sobre a atuação da Lei Aldir Blanc em Feira de Santana. Questionado sobre se o circo foi contemplado por ela, ele afirmou que sim. “A Aldir Blanc sim, mas não fomos contemplados com a Lei Paulo Gustavo. A Aldir Blanc ajudou bastante os circos na pandemia no Brasil inteiro”.

Sobre a Lei Paulo Gustavo, mesmo inscrito e com projeto, não conseguiu ser contemplado. “Fiquei abismado por nenhum circo ter tido o seu projeto aprovado nessa lei em Feira de Santana. O que queremos é uma resposta. É impossível, em mais de dez circos, nenhum ter o potencial de alcançar uma pontuação e ser contemplado. Tenho certeza que eles têm capacidade para isso porque conheço muitos circenses, assim como alguns projetos de pessoas que não são artistas de circo e não foram também contemplados”, reclama.

Com isso, Flay disse que não quer julgar aos que foram contemplados. “Parabenizo a todos, mas deveria olhar para o nosso lado. Logo a mãe de todas as artes não teve um projeto contemplado”. E não houve explicações da não contemplação dos mesmos por parte da Prefeitura de Feira de Santana. “Até o presente momento não temos nenhuma resposta. Os artistas se calaram porque ficaram abatidos e tristes por pensarem que são incapazes. Como eu conheço a maioria e sei do nosso potencial por já termos sido contemplados com outras leis, do Estado principalmente, com projetos grandiosos, para chegar numa lei como essa que é muito importante para o circo e para cultura e não ser contemplado, deixou a desejar”. O que eles queriam ao menos é uma resposta e nada até agora.

Flay chegou a dar aulas da arte circense em Feira de Santana quando o seu circo estava armado no Centro Social Urbano (CSU). Essa vontade surgiu para ele de um sonho de continuar com a arte circense. “Hoje, a maioria dos circenses, devido a todo o sofrimento que passa com burocracia, na vivência de terrenos baldios, sem local para a montagem do circo, a mudança que é muito sofrida e feita no sol, na chuva, chão duro, a falta do público, a insegurança que muitas vezes os espetáculos são a noite e devido a algumas cidades serem violentas tira um pouco do público. Sem contar com a tecnologia, que depois do avanço dela tirou um público grande, já que o nosso público alvo é infantil. Hoje os meninos estão mais com celular, tablet, televisão”.

O sonho de não deixar a arte circense morrer faz com que ele desse aulas. Na época, seus pais estavam doentes e ele decidiu parar com o circo. “Mas parar para deixar o material encostado não queria, queria continuar minha arte. Foi quando o pessoal do CSU confiou em nosso trabalho e abriu as portas para mim, permitindo que eu instalasse a estrutura do circo. Eles não tinham condições de me dar nenhum tipo de ajuda e entendi. Também ajudava no que podia, só que achei injusto cobrar das crianças porque a maioria era carente”.

Ele decidiu então fazer as aulas gratuitamente e precisam até aí apenas do apoio de algumas instituições, mas não conseguiu. “E ficou difícil porque morávamos longe e precisa de transporte. Precisava também de psicólogo, interprete de libras, professores, monitores. O custo estava alto e não estava tendo como fazer. Não dei para se manter. Mas mesmo com as dificuldades, de 50 alunos que tínhamos levamos nove para Santiago, no Chile, para a Escola Pernambucana de Circo, em Recife, devido a projeto do Estado em que fizemos editais e fomos contemplados. Foi isso que custeou a viagem para levar e hoje temos artistas formados e trabalhando em circos grandes do Brasil. Nele, tem artistas que passaram pelas nossas mãos”. 

Hoje, Charmosinho reside em Feira de Santana, mas não está na cidade devido ao circo. Perguntado sobre qual nota daria a sua cidade natal no investimento na área circense, ele disse que não seria boa, dando assim 3, e explica porque. “Saí de Feira, mas Feira não sai de mim. Tive que sair com minha família pela falta de segurança e a desvalorização da cultura para quem não se abre as portas. Estamos na cidade há muitos anos e pouquíssimas vezes fomos valorizados e convidado para algo cultura. A Secretaria de Cultura não tem nem uma recepção adequada aos artistas que tem na cidade e aos que são itinerantes que chegam para serem abraçados. Só os artistas de grande porte são respeitados e tem moral na cidade”, lamenta.

Ele saiu com o coração partido da cidade pelas condições. “Não tenho como me manter em uma cidade grande. Tive que procurar um interior menor, com um custo de vida baixo para poder viver da minha arte. Viver de circo é sofrido”.

Flay já viajou por dez estados e por um país e sabe o quanto é valorizada a arte. “Mas tem alguns municípios ainda, que não sei se por receio ou falta de políticas públicas para pessoas itinerantes, não ajudam. Em algumas delas temos que discutir para que aceite a lei da criança itinerante na escola. Em Feira, muitas vezes tive que ir na Secretaria de Educação sabendo que é lei e eles tem que aceitar o aluno itinerante. Eles diziam que desconheciam a lei”.

Outras cidades são maravilhosas, ressalta o palhaço. “Santanópolis, Coração de Maria, Irará, Santa Bárbara, Santo Estêvão, Ichu, Candeal onde fomos muito bem atendidos e bem tratados. Não posso generalizar todos os municípios como ruins, mas eles têm que abrir mais a mente para a questão da cultura do circo que já é uma vida sofrida”.

A maior luta do artista circense hoje é chegar em uma cidade e achar um terreno adequado próximo das pessoas. “Hoje em dia só armamos em ponta de rua, dentro dos matos com bichos peçonhentos, sem energia porque demora para ligar, água nem se fala porque temos que pagar os moradores para nos ceder porque não fazem ligação provisória por ela ser muito cara. É sofrimento e a gratidão é só porque realmente gostamos de viver da arte”.

Mesmo com todas as dificuldades vale a pena segurar a bandeira do circo, diz. “Não é à toa que eu estou até hoje nele. Nasci numa barraca de circo em 1987 e comecei a me apresentar com quatro anos de idade como palhaço. Trabalho com malabares, equilibrismo, mas me destaco mais na arte do humor, de fazer as pessoas sorrirem. É uma tradição que passa de pai para filho”. 
No momento, ele está passando por um processo de depressão muito forte por estar fora da arte. “Eu acredito que por estar fora da arte me trouxe essa depressão grande. Tenho fé em Deus que isso vai passar”.

Resposta

Procurado pela reportagem do site Boca de Forno News para falar a reclamação do Palhaço Charmosinho em relação a Lei Paulo Gustavo, em que nenhum dos dez circos que apresentaram projetos foram contemplados, o secretário de Cultura, Esporte e Lazer, Jairo Filho, respondeu que todas as ações da aplicação da Lei Paulo Gustavo foram debatidas e construídas pelo Conselho Municipal de Cultura, com a participação do setor cultural nas audiências públicas.

Questionado sobre se a decisão de deixar os circos de fora dos que foram contemplados pela Lei tenha vindo do Conselho, o secretário afirmou que os representantes do circo também participaram das decisões e que 70% dos valores dispostos pela Lei Paulo Gustavo é direcionado ao áudio visual, como já é definido por ela mesma. “Os outros 30% são para mestres e demais artes. Sobre os projetos, todos eles foram avaliados pelos pareceristas e não teve impedimento para Circo participar. Os resultados se dão de acordo com os pareceres”, explicou. 

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