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Política Mudanças

Mudança em projeto que flexibiliza Lei da Ficha Limpa acaba com brecha que beneficiaria Bolsonaro

O ponto principal da proposta é a redução do prazo de perda dos direitos políticos. Sua autora é a deputada Dani Cunha (União Brasil-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. 

20/03/2025 09h05
Por: Karoliny Dias Fonte: Folhapress
Foto: Reprodução
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A atual redação do projeto de lei que flexibiliza a Lei da Ficha Limpa acaba com a brecha que possibilitaria ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tentar reverter sua inelegibilidade e concorrer nas eleições de 2026. 

O ponto principal da proposta é a redução do prazo de perda dos direitos políticos. Sua autora é a deputada Dani Cunha (União Brasil-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. 

Atualmente impedido de concorrer, Bolsonaro poderia ser beneficiado se o tempo de cassação fosse reduzido, podendo voltar a disputar eleições. 

A proposta chegou a entrar em debate no plenário do Senado na terça-feira (18), mas a baixa presença de parlamentares e a possibilidade de que fosse rejeitada adiou a votação. 

A redação que saiu da Câmara dos Deputados e foi aprovada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) determinava que a perda dos direitos eleitorais ficaria condicionada a casos de "comportamentos graves aptos a implicar cassação de registros, de diplomas ou de mandatos". 

Bolsonaro foi condenado em 2023 pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) junto com seu então candidato a vice-presidente, o ex-ministro Walter Braga Netto (PL), por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. 

Mas, como a chapa acabou derrotada nas eleições de 2022, o tribunal não cassou diploma ou registro do ex-presidente. 

Como o projeto tinha efeito retroativo (ou seja, afetaria casos anteriores à sua aprovação), caso ele fosse aprovado da forma como estava após a votação na CCJ, permitiria a Bolsonaro tentar reverter sua inelegibilidade. 

Depois dessa votação, porém, o relator do texto, o senador Weverton (PDT-MA), acatou uma emenda do líder do governo, Randolfe Rodrigues (PT-AP), que altera esse dispositivo e, na prática, acaba com esse argumento. 

A redação proposta por ele mantém a inelegibilidade válida para casos de comportamento grave, mas suprime o trecho que condicionava essa pena à cassação de registros, de diplomas ou de mandatos. 

Segundo parlamentares da base do governo e especialistas ouvidos pela reportagem, essa mudança impede que o ex-presidente use o projeto (caso ele seja aprovado e transformado em lei) como argumento para tentar reaver seus direitos políticos. 

"A emenda acatada elimina a possibilidade de o ex-presidente Jair Bolsonaro alegar a norma em seu favor. Da forma como está no novo relatório, essa hipótese está descartada", afirma o advogado e ex-juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa. 

Três parlamentares aliados a Bolsonaro disseram, sob reserva, que não tinham notado a mudança, mas adotaram o discurso de que não acreditavam que o texto anterior seria suficiente para reverter a inelegibilidade do ex-presidente. 

A principal esperança desse grupo reside no projeto de lei da anistia, que hoje é alvo de divergências na Câmara dos Deputados e não tem a simpatia do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). 

Bolsonaro e seus aliados tentam conseguir apoio de nomes do centrão para tentar fazer a proposta avançar. 

No caso do projeto sobre a Lei da Ficha Limpa, o principal ponto do projeto é a mudança no início da contagem do prazo de inelegibilidade para oito anos. 

Pelo texto atual, esse tempo passa a contar apenas a partir do trânsito em julgado da condenação, é acrescido ao tempo restante de mandato do político (caso ele ainda esteja em exercício) e pode ser cumulativo em caso de mais de uma sentença. 

Com o projeto, o prazo deixa de ser cumulativo e passa a ser unificado em oito anos. Além disso, passa-se a contá-lo a partir da decisão judicial ou da condenação, da eleição na qual ocorra o ilícito ou da renúncia (ou seja, sem levar em conta o tempo restante no cargo). 

"A maior gravidade deste projeto está na redução drástica dos prazos de inelegibilidade", afirma Márlon Reis. 

Sob condição de anonimato, parlamentares dizem que a emenda de Randolfe não foi o que impediu a votação nesta terça, mas sim a possibilidade de derrota. Na deliberação preliminar de um recurso, 34 senadores foram a favor de o projeto avançar, e 21 contra, margem avaliada como pequena para seguir a sessão. 

Não foi definida uma data para que a proposta volte ao plenário, mas congressistas avaliam que isso pode demorar, uma vez que Alcolumbre deve viajar na semana que vem, e o texto é alvo de divergências. 

O relator Weverton tem evitado fazer alterações substanciais no projeto porque, nesse caso, ele precisaria voltar a tramitar na Câmara dos Deputados -e o senador pretende que vá direto para sanção da Presidência da República. 

A emenda de Randolfe, por sua vez, é considerada "de redação", categoria que não exige nova análise pelos deputados. 

Durante a sessão de terça, o senador Omar Aziz (PSD-AM) defendeu o projeto, mas disse considerar problemático o trecho que define que apenas poderão ser condenados com perda dos direitos políticos casos considerados de "comportamento grave", redação que, para ele, abre espaço a subjetividades. 

Carlos Portinho (PL-RJ) também endossou a proposta e afirmou que o prazo de inelegibilidade estipulado pela Lei da Ficha Limpa sempre foi de oito anos, mas que o Judiciário alterou seu "princípio legal" ao determinar que a contagem deste prazo poderia ampliar sua duração. 

Já o senador Marcelo Castro (MDB-PI) defendeu que essa discussão deveria acontecer dentro da proposta do Novo Código Eleitoral, da qual ele é relator e que tem previsão de entrar na pauta da Comissão de Constituição e Justiça no próximo dia 26.

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