O desempenho aquecido do mercado de trabalho reforça as projeções de PIB (Produto Interno Bruto) no Brasil, mas alerta para um possível impacto na inflação.
Segundo economistas, a sequência de avanços do emprego e da renda tende a beneficiar neste ano o consumo das famílias, considerado o motor do PIB pela ótica da demanda.
O possível efeito colateral da procura por bens e serviços em alta é a pressão contínua sobre os preços, que desafiaria o processo de desinflação, ainda mais após a escalada do dólar no país.
"Isso [desempenho do mercado de trabalho] ajuda a sustentar a projeção de crescimento acima de 2% [do PIB de 2024], mas, ao mesmo tempo, coloca preocupação para o Banco Central em relação à inflação, que está caminhando para ficar consistentemente entre 4% e 4,5% neste ano e no ano que vem", afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.
Analistas aumentaram nas últimas semanas as projeções para o PIB e o índice oficial de preços do Brasil, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
No caso do indicador de atividade econômica, a alta prevista pelo mercado financeiro subiu a 2,2% em 2024, conforme a mediana da edição mais recente do boletim Focus, divulgada pelo BC (Banco Central) na segunda (5). A projeção avançou pela quinta semana consecutiva.
Para o IPCA, a previsão passou a 4,12% no acumulado deste ano. Foi a terceira semana consecutiva de alta no Focus.
O boletim, contudo, não havia captado ainda possíveis reflexos dos dados mais recentes de inflação, divulgados na sexta (9) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Segundo o órgão, o IPCA acumulou alta de 4,5% em 12 meses até julho. É o mesmo patamar do teto da meta de inflação perseguida pelo BC no fechamento de 2024, até dezembro.
"A combinação de economia aquecida com câmbio pressionado é bastante perigosa para a inflação", afirma Vale.
André Valério, economista sênior do banco Inter, diz que a reaceleração dos preços de serviços em julho, especialmente em meio ao mercado de trabalho aquecido, pode se mostrar um empecilho para o processo de desinflação e a eventual retomada dos cortes de juros.
"Esperava-se que o mercado de trabalho estivesse mais desaquecido. Ao não estar, há receio de demanda excessiva e inflação", afirma Valério.
"O PIB [mais forte] tem uma combinação de fatores. O mercado de trabalho é um deles, mas a gente tem visto surpresas de modo geral. Nem as enchentes no Sul tiveram o impacto negativo que se esperava [na atividade econômica]", acrescenta.
A taxa de desemprego do Brasil recuou a 6,9% no segundo trimestre, de acordo com os dados mais recentes do IBGE.
Assim, o indicador retornou ao menor nível da série histórica para o intervalo de abril a junho, repetindo o patamar registrado dez anos atrás, em 2014 (6,9%).
Conforme o instituto, a população ocupada com algum tipo de trabalho avançou a 101,8 milhões, o novo recorde da série.
A renda média dos ocupados também seguiu em alta, alcançando R$ 3.214 por mês no segundo trimestre. Isso representa um crescimento de 5,8% na comparação com um ano antes (R$ 3.037).
Em ata publicada na terça (6), o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC subiu o tom, indicando que pode aumentar a taxa básica de juros, a Selic, se achar que a medida é necessária para assegurar a convergência da inflação à meta.
A Selic, atualmente em 10,5% ao ano, é o principal instrumento de controle inflacionário. Quando a taxa de juros sobe, tenta esfriar a demanda que pressiona os preços.
Após a divulgação do IPCA de julho, analistas avaliaram que os dados devem reforçar a preocupação do BC com o horizonte para a inflação. O cenário básico, contudo, ainda descarta uma elevação de juros no curto prazo.
"A inflação dos serviços deve seguir pressionada por causa do mercado de trabalho aquecido", diz Claudia Moreno, economista do banco C6 Bank. A instituição projeta IPCA de 4,7% no acumulado de 2024.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou na quinta (8) que está otimista em relação à economia brasileira, "apesar da crise que o dólar vem causando no mundo inteiro".
Na avaliação do petista, que já fez uma série de críticas ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, a inflação está "totalmente equilibrada".
"A gente se mantém numa situação boa, o emprego está crescendo, o salário está crescendo, a massa salarial está crescendo. O desemprego está caindo, e a inflação está totalmente equilibrada. Esse é um dado muito importante, porque toda vez que alguém fala de inflação eu fico muito preocupado", disse Lula.
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